Orçamento de 2022 ignora fila de espera do INSS; custo pode ir a R$ 11 bi

15/10/2021 17:00
Por Idiana Tomazelli / Estadão

O governo não previu recursos para uma eventual redução da fila do INSS em suas projeções de despesas no Orçamento de 2022. Hoje, há cerca de 1,8 milhão de pedidos aguardando uma resposta do órgão. A proposta enviada ao Congresso tem zero espaço dentro do teto de gastos (a regra que limita o avanço das despesas à variação da inflação) e uma imensa “lista de espera” por mais recursos, que inclui a correção adicional de benefícios devido à alta da inflação, com custo estimado em R$ 19 bilhões, a ampliação do Bolsa Família e emendas para abastecer redutos de parlamentares em ano eleitoral.

Simulações obtidas pelo Estadão/Broadcast apontam que a despesa adicional poderia chegar a R$ 11 bilhões no ano que vem, considerando o valor médio dos benefícios deferidos, uma concessão média de 50% e uma redução gradual da fila.

O governo tem um acordo com Supremo Tribunal Federal (STF), Ministério Público Federal e órgãos de controle para regularizar os prazos de análise dos pedidos de benefício. Por causa disso, técnicos avaliam que seria “prudente” considerar o “desrepresamento” da fila no Orçamento de 2022, o que não foi feito. Os ministérios envolvidos não fornecem nenhuma projeção oficial de despesa com a regularização dos pedidos.

Enquanto isso, brasileiros seguem na espera. Um deles é o gerente de loja Joel Moraes Pessoa, de 57 anos, morador de Valparaíso de Goiás. Ele ingressou com o pedido de aposentadoria por tempo de contribuição em 2 de julho e, até agora, não teve resposta. Atingido pela suspensão de contrato durante a pandemia de covid-19, precisou trabalhar mais tempo que o inicialmente planejado para fechar os 35 anos de contribuição exigidos em lei e cumprir também os seis meses de “pedágio” devido à reforma da Previdência. “Não consigo entender por que essa demora toda. A gente tem o direito de se aposentar. Tenho amigos que estão esperando há seis meses”, afirma.

O requerimento de Sebastião Rolim, de 63 anos, de Ubatuba (SP), vem de mais tempo. Deficiente visual e de baixa renda, ele pediu acesso ao Benefício de Prestação Continuada (BPC) em 22 de maio deste ano. Passou pela avaliação social, em agosto, e por perícia médica no fim de setembro, mas até agora não teve resposta. O benefício, que seria de um salário mínimo (R$ 1,1 mil), faz falta. Sem renda alguma, ele recebe ajuda de amigos, vizinhos e familiares para comer e pagar contas. “Hoje mesmo uma vizinha me deu dois quilos de feijão e um pacote de carne seca”, conta.

Bônus

Em conversas reservadas, técnicos negam que haja uma orientação deliberada para segurar as concessões de benefícios do INSS e, assim, conter artificialmente as despesas do governo. Para sustentar esse argumento, elencam restrições operacionais do órgão, que teve sua capacidade de análise reduzida com o fim da vigência de uma medida provisória que autorizava pagar um bônus aos servidores por análise extra de pedidos atrasados. Apenas esse bônus garantiria uma análise adicional de 150 mil requerimentos ao mês. A pandemia também elevou a demanda por benefícios assistenciais e auxílios-doença, afetando a tentativa de regularização. O próprio acordo judicial também torna mais custoso ter uma fila de requerimentos, pois o governo passou a pagar juros sobre os valores.

“Às vezes, a eficiência ‘atrapalha’. É o caso dos precatórios. A Justiça se tornou mais ágil e apareceram mais precatórios para pagar. Se o INSS se torna mais ágil, aparece mais despesa para pagar e incomoda todo mundo”, afirma o economista Marcos Mendes, pesquisador do Insper e ex-chefe da assessoria especial do Ministério da Fazenda. Mendes tem notado alguma “subestimação” nas despesas com Previdência para 2022 – o que ajudou o governo a apresentar um Orçamento respeitando o teto de gastos.

A reportagem solicitou ao Ministério do Trabalho e Previdência, em 27 de setembro, as projeções oficiais de redução da fila, mas não recebeu nenhum dado. Quatro dias depois, a pasta enviou uma nota em que reconhece que a redução da fila não está incluída nas projeções de despesas da Previdência. “O INSS tem adotado uma série de medidas de gestão visando o desrepresamento de requerimentos de benefícios. A Secretaria de Previdência tem buscado acompanhar e apoiar essas medidas. No que se refere às projeções de despesas do RGPS, o modelo considera o histórico recente das concessões. Eventuais ajustes decorrentes da evolução do desrepresamento são captados nas revisões bimestrais”, diz o comunicado. INSS e Ministério da Economia não responderam até a conclusão desta edição.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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