Orlando Drummond, o ‘Seu Peru’ da ‘Escolinha’, sai de cena aos 101 anos

28/07/2021 07:47
Por André Carlos Zorzi / Estadão

Humorista, ator e dublador, figura conhecida há décadas na televisão brasileira, Orlando Drummond – o Seu Peru da Escolinha do Professor Raimundo – morreu ontem no Rio, aos 101 anos de idade, em decorrência de falência múltipla de órgãos, segundo informou a assessoria da TV Globo. Como dublador, emprestou sua voz a personagens marcantes como Scooby-Doo, Popeye e Alf, o Eteimoso. Deixa a mulher, Glória, dois filhos, cinco netos e três bisnetos.

Drummond não chegou a apresentar, ao longo das últimas décadas, qualquer histórico de grandes problemas de saúde. Apenas em 2015 foi que começou a ter quadros de tontura. No mesmo ano, sofreu acidente em sua casa, fraturando quatro costelas e foi internado. No ano seguinte, aos 96, sofreu queda de pressão e caiu da escada, fissurando o fêmur. Em abril de 2021, foi internado com infecção urinária grave.

O sucesso de Seu Peru, na Escolinha, abriu-lhe espaço para uma de suas últimas aparições na TV, em um episódio especial da versão mais recente do programa, gravado em 2019. Na ocasião, contracenou com Marcos Caruso – que interpreta o Seu Peru na fase mais recente do programa – e foi aplaudido pelos atores da nova geração.

Na mesma época, já beirando os 100 anos, também apresentou um de seus últimos trabalhos como dublador, fazendo a voz do Vingador, de A Caverna do Dragão, para a propaganda de uma marca de carros.

Drummond nasceu em 18 de outubro de 1919, no bairro de Todos os Santos, zona norte do Rio de Janeiro. Era o sétimo filho de seu pai, Arthur Candido Cardoso, e o quinto da mãe, Alcinda Drummond. Começou a trabalhar como entregador de armazém aos 13 anos e aos 17 foi atrás de seu primeiro emprego “de fato”, vendendo na rua os chapéus de uma loja no centro.

Incentivado pelo pai, foi aprovado em um concurso para o Departamento Administrativo do Serviço Público, tornando-se escriturário no Ministério do Trabalho. Sem se adequar à função, pediu demissão e foi ser vigia em um posto de gasolina.

No rádio

Só em 1942 ele teve seu primeiro trabalho na rádio, uma de suas paixões. A vaga era para ser contrarregra na Rádio Tupi. A convite de Paulo Gracindo, que considerava seu “guru”, fez dois testes como ator e exibiu sua veia cômica. Depois, Drummond conseguiu emplacar pontas mais bem-sucedidas em seis episódios do Grande Theatro Eucalol.

Entre os personagens de destaque no início da carreira, interpretou Fifico Papoula – o primeiro de trejeitos afeminados, como outros tantos que faria. Em 1953, surgiu o índio Taco, dupla de Pataco (Otávio França), do humorístico Uma Pulga na Camisola, que foi ao ar na rádio e na TV Tupi.

Nos anos 2000, Pataco e Taco retornaram ao ar no Zorra Total, da Globo, com Paulo Silvino no lugar de França. “Nem acreditei quando o (diretor do Zorra) Maurício Sherman ligou para me convidar para voltar com o quadro. Antes de responder o “sim” eu só falava no telefone: “Pezinho pra frente! Pezinho pra trás!”, repetindo o bordão do personagem.

Com Ankito

Como ator, fez sua estreia no filme O Rei do Movimento, protagonizado por Ankito em 1954. Foi a primeira vez em que fez um personagem afeminado no cinema, Natanael, dono de uma loja de joias que aparece em apenas duas cenas. Em Angu de Caroço, outro filme de Ankito, lançado no ano seguinte, voltou a interpretar um homossexual, Lulu. Orlando Drummond voltaria às grandes telas no filme O Doce Esporte do Sexo, de Chico Anysio, no ano de 1971.

Em 1956, na TV Tupi, ele participou de Ali Babá e os Quarenta Garçons e ainda fez o Hotel da Sucessão e Marmelândia, o País das Maravilhas. Com os investimentos feitos na televisão, muitas demissões ocorriam na rádio da emissora, o que acabava sobrecarregando parte dos artistas. Sem se sentir valorizado pela direção e sem receber os salários em dia, Drummond decidiu ir para a rádio Mayrink Veiga, como ensaiador e diretor.

Em 1963 e 1964 se destacou com a imitação do ex-presidente Jânio Quadros. O próprio Drummond não aprovava a paródia bêbada do político: “Não é minha responsabilidade a maneira de apresentar o programa, o personagem. Eu, como artista disciplinado, obedecia às marcações que o produtor preparava e dava minha melhor atuação”.

Aos 54 anos, com o tempo de trabalho necessário para se aposentar e se dedicar mais à dublagem, decidiu se desligar da Tupi em negociação amigável.

A parceria com Chico Anysio teve início em 1982, quando Drummond foi chamado para fazer pequenas participações no Chico Anysio Show. Quatro anos depois, ganharia seu primeiro personagem fixo no programa, o Cachorro Jorge, um cão “malufista”, à época em que o governo de José Sarney tentava driblar a hiperinflação.

Seu Peru

Em 1988, foi chamado para integrar o elenco da Escolinha do Professor Raimundo. Curiosamente, o personagem Seu Peru não foi criado pensando nele. Chico Anysio lembrou-se de outros personagens gays de Drummond, que ganhou uma chance e ficou. Em 1992 o programa era exibido durante a tarde. Em 1998, foi participar do Zorra Total, que seria lançado em 2000. Desta vez, a Escolinha voltava como quadro.

Chico Anysio e Orlando Drummond ainda voltaram a se encontrar em 2010, no encontro entre os vampiros Bento Carneiro e Vamperu, e, pela última vez, no especial Chico e Amigos, em 2011 (Chico morreria no ano seguinte).

Fora dos programas de Chico Anysio, Orlando Drummond teve um currículo breve na televisão nas décadas mais recentes.

Aos 90 anos, já com dificuldades de locomoção e alguns problemas de memória, começou a se afastar das telas. “Eu ainda conseguia decorar os textos, mas na hora de gravar me dava um branco. Por isso, eu mesmo tomei a decisão de conversar com o Maurício (Sherman) para reduzir as gravações”, dizia Drummond. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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