Paisagem do desastre de 2011 continua igual

06/06/2016 08:00

Mais de cinco anos depois da maior catástrofe climática do Brasil ter devastado grandes áreas da região serrana do Rio, causando a morte de mais de 900 pessoas, e deixando milhares de desabrigados, parte das cidades de Petrópolis, Teresópolis e Nova Friburgo ainda não foi recuperada. Em Itaipava, por exemplo, uma das regiões que mais sofreu com a chuva, no bairro de Santa Mônica pelo menos seis famílias ainda moram em casas que foram atingidas pela enchente. Esses imóveis estão incluídos no projeto de recuperação do Inea e começaram a ser demolidos. No entanto, o serviço não foi concluído e os moradores voltaram. A equipe de reportagem da Tribuna, que vem acompanhando o caso, foi até a região, nesta semana, e conversou com alguns dos moradores. A maioria não quis dar entrevista, com medo de serem retirados de suas casas. Mas uma aposentada, que preferiu não se identificar disse que assumiu o risco de morar em uma faixa de perigo por falta de opção. “Eu fui nascida e criada no Gentio. Me mudei para Santa Mônica há uns 25 anos. Depois da chuva de janeiro de 2011, que inundou minha casa e destruiu quase todos os meus móveis, eu tive que sair, mas voltei pra cá, porque não tenho outra saída”, desabafou, emocionada. A idosa contou à nossa equipe que morou durante seis meses em casas de parentes, mas voltou pra casa depois disso. “Eu não posso ficar pra sempre na casa dos outros. Eu tenho minha vida, e eles têm a deles. Foram solidários, mas é muito ruim, ainda mais numa situação financeira difícil, você ter que abrigar uma pessoa por tempo indeterminado em sua casa. Pior ainda pra mim, que me sentia incomodada por estar de alguma forma atrapalhando a vida deles, sem ter culpa”, explicou. A casa onde a nossa entrevistada mora está parcialmente destruída, e o seu quintal está em ruínas. Entulhos, lama e galhos de árvores tomam sua volta. A Tribuna perguntou se ela não tem medo de morar num imóvel que está condenado e teve sua demolição interrompida. A aposentada, muito emocionada, disse: “Ter medo de uma nova tragédia como aquela eu não tenho. Mas sei que qualquer enchente pode levar essa casa. Mas se eu sair daqui, para onde vou?”, completou. Segundo o Instituto Estadual do Ambiente (Inea), até hoje mais de 200 casas foram demolidas nas dez cidades afetadas pela catástrofe. O órgão não soube apontar o número exato das residências em ruínas no distrito de Itaipava. Logo depois da tragédia, a então presidente, Dilma Rousseff assinou um documento junto ao chefe do estado, Sérgio Cabral e ao secretário de obras, que na época era Luiz Fernando Pezão, doando mais de R$ 678 milhões para intervenções emergenciais no programa de recuperação da região serrana. O pacote, que faz parte de um pacto entre os governos estadual e federal, incluía a construção de 6,8 mil casas e 163 estabelecimentos comerciais, além da reconstrução de mais de 60 pontes e a contenção de 37 encostas. Entre os municípios beneficiados, além de Areal e São José do Vale do Rio Preto, estava Petrópolis. A previsão, de acordo com o pró- prio Governo Federal, era de concluir parte do projeto, com a entrega de 6 mil moradias até o fim de 2012. No entanto, até hoje, milhares estão esperando suas casas.

O Governo do Estado, em janeiro do ano passado, anunciou um investimento de mais de R$ 500 milhões na parte de moradia para as famílias afetadas. No entanto, em Petrópolis somente 50 casas foram concluídas.

Sobre a recuperação das áreas atingidas pela chuva, o Inea, que é do governo estadual, informou que a 1ª fase das intervenções previstas para região de Petrópolis já foi concluída. O órgão disse que está promovendo a continuidade das obras, mas que para isso está sendo preciso viabilizar o que chamou de “certame licitatório” para a conclusão das etapas subsequentes, como a continuidade das obras e projetos para desassoreamento, conformação das calhas, proteção e contenção das margens dos Rios Santo Antônio, Cuiabá e Carvão.

Com relação à conclusão das demolições o órgão não soube responder, e disse apenas que está providenciando o que for preciso e atendendo às solicitações do Tribuna de Contas do Estado do Rio de Janeiro, para que o edital para demolição e construção de novas moradias seja autorizado o quanto antes.


Civis considera gastos excessivos

O coordenador do Instituto Civis, Mauro Corrêa, se posicionou contra os gastos com demolições e falta de atenção para áreas que já foram atingidas por tragédias anteriores. “A nossa preocupação desde o início era que acontecesse essa tragédia. Em 2008, no mesmo local, teve um temporal e morreram oito ou nove pessoas. Depois disso o então prefeito compareceu à região, com o governador e um secretário estadual do ambiente. Eles prometeram mundos e fundos para recuperar a área. No fim de 2010 foram até o lugar, em Itaipava, e constataram que nada havia sido feito. Aí em 2011 aconteceu a tragédia e essas pessoas que deveriam ter sido removidas dali, com políticas de assistência, acabaram morrendo. Se eles tivessem tomado medidas preventivas com certeza o estrago não seria tão grande quanto foi”, explicou Mauro, que acredita na punição como forma de solução para os problemas relacionados ao abandono do poder público. “Consideramos uma irresponsabilidade. Isso só vai acabar quando os funcionários públicos e cargos comissionados forem responsabilizados criminalmente por essas omissões”, revelou.

O coordenador do Civis disse que considera ainda que os investimentos anunciados, de forma paliativa são incapazes de resolver o grande problema. “Deveriam investir em reflorestamento e realocar essas pessoas com políticas habitacionais”, concluiu, destacando que outras áreas em vários distritos da cidade têm pessoas em situação de risco que até hoje não receberam suas casas.

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