Pandemia ameaça realização da Olimpíada e especialistas já calculam prejuízos

14/02/2021 08:20
Por Alessandro Lucchetti e Raphael Ramos / Estadão

Restando menos de seis meses para os Jogos Olímpicos de Tóquio, a decisão do governo do Japão de estender o estado de emergência por várias regiões do país, incluindo a capital, por causa da pandemia do novo coronavírus levanta dúvidas sobre a realização do evento, marcado para julho. Apesar de o Japão, na comparação com outros países, ter sido relativamente pouco afetado pela covid-19, com cerca de 6 mil mortos, de acordo com números oficiais, o sistema de saúde do País está saturado e a popularidade dos Jogos não é grande.

Pesquisas recentes apontam que grande parte dos japoneses é contrária à realização da competição no país este ano, temendo que isso aumente os casos de coronavírus. Muitos defendem o cancelamento da Olimpíada porque o Japão, por exemplo, só deverá começar a vacinar seus cidadãos no fim do mês.

Como, em março de 2020, o Comitê Olímpico Internacional (COI) já tomou a decisão histórica de adiar o evento por um ano, algo inédito na história dos Jogos, a competição não será novamente adiada. Pelo menos é o que garantem os organizadores. “Neste momento, não temos nenhuma razão para crer que os Jogos não serão abertos no dia 23 de julho, no Estádio Olímpico. Não estamos especulando se os Jogos serão realizados. Estamos trabalhando em cima de como os Jogos serão realizados”, insiste Thomas Bach, presidente do COI.

Estudo elaborado por Katsuhiro Miyamoto, professor de teoria econômica da Universidade de Kansai, no Japão, aponta que organizar Jogos Olímpicos e Paralímpicos sem público implicaria prejuízo de US$ 3,7 bilhões (cerca de R$ 19,8 bilhões). Caso se computem os gastos com consumo dos visitantes, perdas da indústria do turismo e na promoção de eventos esportivos e culturais, a soma chegaria a US$ 23,1 bilhões (R$ 124 bilhões).

O estudioso projetou ainda outros cenários, como a perda de US$ 44,1 bilhões (R$ 236 bilhões) caso os Jogos de Tóquio sejam cancelados, e de US$ 13,6 bilhões (R$ 73 bilhões)caso o número de espectadores seja reduzido pela metade. O adiamento de 2020 para 2021 já teria acarretado um acréscimo no orçamento de US$ 2,8 bilhões (R$ 15 bilhões), elevando o valor total para US$ 15,8 bilhões (R$ 84 bilhões), fazendo dos Jogos de Tóquio os mais caros da história. Nesse custo, US$ 1 bilhão se refere apenas às medidas de combate à covid-19.

Dos US$ 15,8 bilhões do custo atualizado da Olimpíada de Tóquio, US$ 6,7 bi são bancados por recursos privados. O restante sai dos cofres das instâncias governamentais do Japão. Para tentar minimizar os efeitos, o Comitê Organizador procura aumentar a fatia do orçamento bancada por patrocinadores, que contribuem com US$ 3,3 bilhões, levantados pela Dentsu Inc., a agência de publicidade dos Jogos. De acordo com o jornal Nikkei, os 15 maiores patrocinadores domésticos deverão elevar sua contribuição em US$ 150 milhões.

Segundo Gajuki Ito, diretor financeiro do Comitê Organizador, a cobertura de seguros vai se encarregar de transferir US$ 500 milhões para dar resposta ao acréscimo nos custos causado pelo adiamento. Caso os Jogos sejam cancelados, o prejuízo das seguradoras subiria para uma cifra situada entre US$ 2 bilhões e US$ 3 bilhões.

O COI admite que a possibilidade de um número limitado de torcedores e até a não presença de público são opções possíveis. A decisão sobre uma eventual presença das pessoas nas arenas, inclusive de espectadores vindos do exterior, porém, só deve ser tomada nos próximos meses. Não tendo público, para quem comprou ingresso o dinheiro será devolvido.

Várias associações de médicos japoneses apelaram aos organizadores para limitar o número de espectadores nas arenas, observando que o sistema de saúde do país está sendo sobrecarregado pela atual onda de infecções da covid-19. O Comitê Organizador arcaria com um prejuízo de US$ 800 milhões caso seja proibida a presença de torcedores nas disputas olímpicas.

ARENAS – Para os Jogos de Tóquio, estão previstas mais de 40 instalações esportivas, algumas construídas para a competição e outras temporárias. O adiamento da Olimpíada não mudou o planejamento original. Todas as instalações continuam à disposição dos organizadores, com pequenos ajustes por questões logísticas não especificadas.

A última instalação entregue aos atletas foi o Centro Aquático. O endurecimento das restrições para entrar no Japão, no entanto, forçou o adiamento do primeiro evento do ano vinculado aos Jogos. Programado para ocorrer de 4 a 7 de março em Tóquio, o Pré-Olímpico de nado artístico, que reuniria atletas de dez países, será realizado de 1 a 4 de maio no Centro Aquático.

O principal centro de competições dos Jogos será o novo Estádio Olímpico de Tóquio, com capacidade para 68 mil espectadores.

VILA OLÍMPICA – Com 21 torres de 14 a 18 andares e vistas para a baía de Tóquio, o local abrigará 11 mil atletas e membros das delegações, mas ele virou o calcanhar de Aquiles para os organizadores dos Jogos.

Cerca de 900 apartamentos foram vendidos antes do adiamento dos Jogos devido à pandemia e os proprietários não puderam tomar posse dos imóveis na data prevista inicialmente. Alguns compradores dos apartamentos, inclusive, entraram na Justiça pedindo indenizações. Algumas unidades estão avaliadas em US$ 1,6 milhão. Muitos alegam que venderam seu antigo apartamento e pediram um empréstimo para financiar o novo. O cancelamento dos Jogos poderia facilitar que esses proprietários pudessem entrar nos imóveis antes do segundo semestre.

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