Parisienses veem caos e mudança ‘brusca’ de rotina durante os Jogos Olímpicos

22/jul 20:35
Por Bruna Arimathea / Estadão

Em frente da Torre Eiffel, o cartão postal mais famoso de Paris, além dos arcos olímpicos, uma grande arena foi montada para receber os jogos de vôlei de praia durante os Jogos, que acontecem de 26 de julho a 11 de agosto. A estrutura, porém, agrada mais aos estrangeiros do que aos próprios moradores da capital da França. O motivo? Muitos deles não estão otimistas com o evento, que vai levar mais de 15 milhões de pessoas para as ruas da cidade luz.

Lorena Galeota é italiana e mora em Paris há quatro anos. A professora de 32 anos afirmou que já é possível observar, há semanas, o que as mudanças na cidade podem gerar durante os Jogos – e porque os parisienses, mesmo acostumados com o grande volume de turistas, temem que seja um período de pouco sossego.

“As pessoas estão com medo de que a cidade fique lotada, que as ruas sejam fechadas e que seja difícil chegar ao trabalho. Esse é um tipo de problema com o qual os parisienses têm que lidar, mas acho que para a Olimpíada isso será em uma escala maior”, diz Lorena.

A francesa Orane Gédoux, residente da cidade há 7 anos, também não espera ter tranquilidade enquanto o evento estiver acontecendo. “Não sei se isso é bom para Paris. A cidade já está superlotada normalmente e será ainda mais complicado durante a Olimpíada”, explica.

DIFICULDADES

A principal reclamação é a confusão que estações e ruas fechadas podem trazer para o cotidiano de quem trabalha no centro da cidade. Com linhas de ônibus e metrôs voltadas para o evento, será preciso uma autorização especial para utilizar alguns trajetos, que serão destinados apenas para quem tiver ingresso para os jogos.

“No momento, estamos com falta de informações. Não sabemos como poderemos nos locomover ou quais rotas serão realmente bloqueadas”, afirma Orane, que deve ficar na cidade apenas nos primeiros dias dos Jogos.

Os preços também sofreram inflação com a Olimpíada na capital francesa. Os bilhetes de uma viagem de metrô, por exemplo, que antes custavam 2,15 euros, vão ser encontrados por 4 euros nos meses de julho e agosto. Já as passagens de ônibus dobram de valor: de 2,5 euros para 5 euros.

“Todos os dias, em Paris, enfrentamos problemas de transporte sem Olimpíada. Portanto, com a Olimpíada, será uma bagunça. Mas algo que é muito, muito injusto é o preço. O preço do transporte público não será bom”, explica Lorena.

O trânsito, outra questão delicada para os parisienses, também já sofre impactos do evento. Em uma caminhada entre o Museu do Louvre e a avenida Champs Elysée, o tráfego já denuncia as consequências das estações fechadas e das grades que cercam parte das vias. A Ponte Alexandre III, por exemplo, uma das mais famosas da cidade, está interditada. outro marco da cidade, a Praça da Concórdia, também está cercada para sediar um dos eventos dos Jogos.

Chiara Dias, estudante de 19 anos, afirma que o tráfego piorou desde que as estruturas para os Jogos começaram a ser montadas. A parisiense afirma que o trajeto que faz do trabalho para casa, em que utiliza pelo menos uma condução de metrô e uma de ônibus, tem demorado mais que o normal nas últimas semanas.

“Sou de Paris e sei que temos problemas com o trânsito. Mas tem ficado muito pior nos últimos dias por conta dos fechamentos e do volume de carros nas vias que estão abertas”, aponta Chiara.

SAIAM DA CIDADE

Ter os jogos olímpicos no quintal de casa seria um privilégio para algumas pessoas – Orane não é uma delas. A recrutadora afirmou que além da dificuldade de locomoção, os parisienses que não estarão nos eventos também foram “convidados” a sair da cidade no período.

“A cidade está fazendo de tudo para estar pronta para receber os torcedores olímpicos, mas está pedindo aos moradores que saiam, o que é uma mensagem bastante incomum”, afirma a recrutadora.

Alguns locatários de apartamentos pediram para seus inquilinos tirarem férias ou os encorajaram a passar os meses de julho e agosto em outros países da Europa. Assim, seria possível alugar os espaços a preços muito mais altos para os turistas que estarão na capital para ver os jogos.

De acordo com Orane, algumas outras medidas, que também partem do governo, encorajam que as empresas adotem o home office no período ou que adaptem o período de férias para a duração dos jogos – na França, é comum que o mês de agosto seja destinado às férias escolares e de trabalho.

Valérie Pécresse, presidente da Ile-de-France Mobilités (IDFM), a autoridade de transporte regional, pediu ainda em dezembro do ano passado que as empresas encorajassem o trabalho remoto no período dos Jogos e que aqueles que puderem ficar em casa para evitar uma sobrecarga no transporte público parisiense o façam. A recomendação foi endossada pela prefeita de Paris, Anne Hidalgo.

Com os jogos, Lorena é uma das muitas pessoas que vão deixar a cidade no período. A italiana vai aproveitar o período para visitar a família na Itália. Mas conta que, por conta do trabalho, sua namorada vai precisar ficar na cidade.

“Acho que será muito, muito difícil para as pessoas que ainda estão trabalhando em Paris, que terão que trabalhar normalmente durante a Olimpíada”.

Chiara também vai aproveitar o período, que é tradicionalmente de férias, para sair da cidade e visitar outras partes da França. “Vou aproveitar minha pausa nos estudos para fugir um pouco da cidade. Acho que vai ser (uma forma de ter) um pouco mais de tranquilidade”.

Com a rotina remexida, alguns parisienses, porém, torcem para que o período seja o mais tranquilo possível, com multidões controladas e um bom funcionamento das instalações – e estão até ansiosos para os eventos de julho e agosto.

Brahim Sabir, que mora em Paris há cinco anos, é um dos que estão com presença confirmada nos ginásios. O marroquino será um dos 45 mil voluntários dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos deste ano.

“Estou empolgado porque é um evento realmente grande e que vou poder fazer parte. Sinto que as estruturas estão sendo preparadas para tentar absorver a demanda de público e mesmo com a cidade lotada acredito que será uma boa experiência como um todo”.

Já Orane torce para que a Olimpíada traga benefícios para a cidade e que seja diferente do que ela e parte dos seus amigos esperam que seja: um grande caos. “Estou curiosa para ver como será. Espero estar errada e que seja algo bom para Paris”, afirmou.

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