Receio fiscal ofusca tom duro do Copom e devolve dólar a R$ 6,00

12/dez 18:39
Por Antonio Perez / Estadão

As incertezas fiscais domésticas e o avanço da moeda americana no exterior impediram que o real se beneficiasse nesta quinta, 12, do choque de juros promovido nesta quarta, 11, pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central. Após um mergulho nas primeiras horas de negócios, quando furou o piso de R$ 5,90 e registrou mínima a R$ 5,8681, o dólar à vista ganhou força no restante do pregão e voltou a fechar acima do nível de R$ 6,00.

A derrocada do real se deu em meio a notícias sobre as negociações do pacote fiscal no Congresso, que acentuaram o risco de desidratação e redução da potência das medidas de contenção de gastos propostas pelo ministério da Fazenda. Esse movimento se deu em conjunto com a piora dos demais ativos domésticos, em especial avanço dos juros futuros longos, mais ligados à percepção de risco fiscal.

Operadores citaram também fatores técnicos que podem ter turbinado o dólar, como ajustes e realização de lucros, após o tombo da moeda ontem no fim da tarde e hoje pela manhã, e demanda pontual mais forte de importadores. Ontem, o dólar mergulhou na reta final da sessão e fechou em queda de 1,53%, em movimento que coincidiu com a informação de que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva passaria por novo procedimento intracraniano.

Após máxima a R$ 6,0487, o dólar à vista perdeu parte do fôlego na reta final dos negócios e fechou em alta de 0,86%, cotado a R$ 6,0072. Principal termômetro do apetite por negócios, o contrato de dólar futuro para janeiro apresentou giro expressivo, acima de US$ 19 bilhões – que sugere mudanças relevantes de posicionamento dos investidores.

Lá fora, o índice DXY – termômetro do comportamento da moeda americana em relação a uma cesta de seis divisas fortes – apresentou leve alta, aproximando-se dos 107,000 pontos na máxima (106,962 pontos). As taxas dos Treasuries subiram após resultado acima do esperado da inflação ao atacado nos EUA. A moeda americana subiu em bloco na comparação com divisas emergentes e de países exportadores de commodities, com o real como grande destaque negativo.

O economista-chefe da Monte Bravo, Luciano Costa, afirma que após a reação inicial do mercado ao tom mais duro do Copom, a taxa de câmbio voltou a espelhar o desconforto com a questão fiscal, que tem caráter mais estrutural.

“As notícias de tramitação das medidas não foram boas, com mudanças em projetos de lei que tiram potência e efetividade do pacote. E o prazo para votação neste ano é muito apertado”, afirma Costa. “E mesmo que o governo consiga a aprovação, vai ter que adotar novas medidas mais à frente para cumprir as metas”.

O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, se reuniu hoje à tarde com os relatores do plano fiscal no Congresso. Fontes ouvidas pelo Broadcast afirmaram que haverá mudanças em propostas relacionadas ao BPC e ao projeto que limita utilização de créditos para compensação de débitos tributários.

Ontem, o Copom elevou a taxa Selic em 1 ponto porcentual, para 12,25%, em um comunicado considerado duro. A decisão já era esperada por ala relevante do mercado. A surpresa ficou por conta da afirmação de que o comitê “antevê, em se confirmando o cenário esperado, ajustes de mesma magnitude nas próximas duas reuniões”.

Em tese, juros mais altos aumentam a atratividade para operações de carry trade, que exploram diferença de juros entre países. Além disso, tornam mais custoso o carregamento de posições em dólar, o que deveria levar a desmonte de parte de hedge cambial e até de apostas contra a moeda brasileira.

“Deveríamos ver um movimento de apreciação do câmbio com o BC reforçando a âncora monetária. Mas o quadro fiscal está tão fragilizado que não há espaço para os prêmios de risco cederem”, afirma Costa, da Monte Bravo.

Pela manhã, o BC vendeu oferta integral de US$ 4 bilhões divididos em dois leilões de linha com compromisso de recompra. Operadores afirmam que a operação buscou suprir demanda de moeda à vista típica de fim de ano, quando as linhas para financiamento de comércio escasseiam e há remessas de lucros e dividendos ao exterior.

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