”Renascer’ me fez crescer muito’, diz Adriana Esteves

12/10/2021 07:20
Por Danilo Casaletti, especial para o Estadão / Estadão

Em sua volta para a TV Globo, em 1993, depois do sucesso que fez com Pantanal na extinta TV Manchete, o autor Benedito Ruy Barbosa emplacou na faixa das 8 da noite Renascer. A trama contava a história de um fazendeiro – o coronel Zé Inocêncio – que comandava um império do cacau com mãos de ferro. A novela exclusivamente rural, que caiu no gosto do público, entra agora para o catálogo da Globoplay e a partir desta segunda, 11, poderá ser assistida em edição completa – são 126 capítulos.

Ao lado de Antônio Fagundes e Marcos Palmeira, Adriana Esteves, então com 23 anos, protagonizava a trama. A atriz deu vida a Mariana, neta de um dos inimigos de Zé Inocêncio. Com o desenrolar do folhetim, ela fica dividida entre o amor de Inocêncio e o de seu filho enjeitado, João Pedro, personagem de Palmeira.

A personagem ganhou a antipatia do público e a atriz sofreu duras críticas por sua atuação. “Mariana era rica e importante na trama, mas houve uma certa rejeição, a meu ver, conservadora”, diz Adriana, agora, em entrevista por e-mail ao Estadão.

Renascer ainda tinha no elenco nomes como Fernanda Montenegro, em participação especial como a cafetina Jacutinga; Osmar Prado, como Tião Galinha; Eliane Giardini, como dona Patroa; e Chica Xavier como Inácia. Barbosa tocou em assuntos polêmicos como o hermafroditismo, que virou discussão à época, e o celibato religioso.

Adriana, que recentemente atuou em Amor de Mãe – novela interrompida e posteriormente adaptada em razão da pandemia de covid -, em breve estará no elenco de dois filmes que estreiam em novembro. Um é Marighella, de Wagner Moura, que conta a história do escritor e político comunista Carlos Marighella. O outro, Medida Provisória, de Lázaro Ramos, que discute questões raciais por meio de um enredo no qual o governo brasileiro decreta um ato em que obriga cidadãos negros a voltarem para África.

Quais as principais lembranças que você tem de Renascer?

Renascer me apresentou a Bahia. Na época, eu tinha apenas 23 anos. Nunca tinha ido àquele lugar maravilhoso. Gravamos praticamente um ano em Ilhéus, alternando com os estúdios no Rio de Janeiro. Hoje, quase 30 anos depois, sou casada com um baiano e até tenho residência lá. A família de Vladi (Vladimir Brichta) é de Itacaré, cidade bem próxima a Ilhéus. Essa novela me enche de boas recordações. Uma das melhores que já fiz.

A direção geral da novela foi de Luiz Fernando Carvalho, que tem uma visão peculiar na TV, com um ritmo mais lento da narrativa. Havia também o Walter Carvalho na fotografia. O que aprendeu trabalhando com eles?

Luiz Fernando Carvalho tem uma importância gigantesca em minha formação como atriz. Ele me apresentou esse ofício na televisão da forma com que me identifico hoje. O olhar dele, tudo que ele me ensinou e procurou despertar em mim foi fundamental para a atriz que me tornei. Walter Carvalho é um presente para a beleza da nossa televisão. Depois de Renascer, já tive o prazer de trabalhar com ele várias vezes.

Renascer foi um grande êxito de Benedito Ruy Barbosa. Como foi dar vida a uma personagem dele? Vocês tiveram algum tipo de contato?

Benedito é um grande autor e sem dúvida um dos maiores. Mas nunca o conheci.

Sua personagem Mariana tinha um lado meio dúbio que talvez não tenha ficado claro para o público de imediato. Isso lhe rendeu críticas. Como lidou com elas naquele momento?

Mariana era uma personagem muito só, e acho que não ficou claro na época se ela seria apenas uma mulher em busca de vingança. A paixão dela pelo filho (João Pedro) e o envolvimento amoroso com o pai (Zé Inocêncio) também não foram muito aceitos. A personagem era rica e importante na trama, mas houve uma certa rejeição, a meu ver, conservadora. Na época eu não tinha maturidade para separar o que eram críticas ao meu trabalho e o que se referia à história da personagem.

Recentemente, você declarou que passou por um período de depressão durante ou logo após a novela. Como isso se deu? Acredita que foi em consequência das críticas que recebeu?

O período que fui diagnosticada com depressão foi em seguida da novela. Por isso foi associado. Mas a verdade é que eu vinha de um forte cansaço emendando várias novelas como protagonista – e muito jovem. Foi um período muito difícil da minha vida, mas graças a ele tive a oportunidade de crescer e aprender a me cuidar. E isso é para sempre.

Naquela época não havia redes sociais. Como as críticas chegaram até você?

As novelas eram muito vistas. Uma audiência enorme. E as celebridades que estavam em foco eram os atores. Existia muito espaço na imprensa para se falar sobre novelas e os artistas.

Aliás, você não usa redes sociais. Não gosta?

Ainda prefiro não ter redes sociais. Posso alguma hora mudar de ideia. Tenho minhas necessidades de proteção e autocuidado.

Agora, com o distanciamento de quase 30 anos, como você avalia tudo o que aconteceu à época?

Acho que foi uma belíssima novela, que me fez crescer muito e, se na época eu tivesse mais maturidade, poderia ter sofrido bem menos.

Depois de Renascer, você fez participações em programas e séries da Globo e, em seguida, foi fazer uma novela no SBT. Foi um período de readaptação?

Fui fazer teatro. Entrei para o elenco da peça A Falecida, com Maria Padilha e direção de Gabriel Villela. Foi encantador para mim. Viajamos pelo Brasil e pela Europa. Em seguida, fui convidada para fazer outra novela como protagonista. Eu não tinha condições. Estava muito cansada e começaram a surgir em mim os sintomas de depressão. Doença importante que deve ser falada. Nessa ocasião tive que parar tudo. Voltei a trabalhar aos poucos, uns dois anos depois. Fiz uma novela no SBT, Razão de Viver, e, em seguida, voltei para a TV Globo fazendo A Indomada (1997).

Você volta à Globo com uma nova protagonista das 8. Dessa vez, com sucesso. O que foi diferente?

Voltei mais forte, cuidada, livre da depressão e feliz. Estava casada com meu grande parceiro (o ator Marco Ricca), que conheci em Renascer e foi um companheiro que me fez amar viver e ser atriz. Devo muito a ele. Temos Felipe, nosso filho, hoje com 21 anos.

Estamos falando de novelas clássicas. Não podemos deixar de citar a Carminha de Avenida Brasil, que está na galeria de grandes vilãs da história da telenovela brasileira. Ela é, surpreendentemente, adorada pelo público. O que guarda dessa personagem?

Carminha é quase meu segundo nome (risos). Foi o maior presente que a TV Globo e o João Emanuel Carneiro (autor de Avenida Brasil) me deram.

Recentemente, vocês e seus colegas de elenco em Amor de Mãe passaram por algo inédito na história da telenovela brasileira. Por conta da pandemia, a novela foi interrompida – e ela estava em um de seus principais clímax – e retomada meses depois. Como foi essa experiência?

A pandemia trouxe uma tristeza a todos nós no mundo difícil de narrar. A surpresa de ter que parar as gravações foi inédita e enorme. Quando voltamos, cercados de todos os cuidados e protocolos, nos unimos muito. Cheios de receios e dúvidas. Mas felizmente conseguimos finalizar. Mas foi dificílimo.

Em breve, o filme Medida Provisória, estreia de Lázaro Ramos como cineasta, chegará aos cinemas. O que você pode falar sobre sua personagem?

Ela se chama Isabel Garcês. É uma funcionária do governo que quer fazer valer uma medida decretada, obrigando cidadãos negros a voltarem à África. Uma mulher desumana.

Como foi trabalhar com o Lázaro diretor? Aliás, no elenco ainda estão Taís Araújo e Renata Sorrah. São atrizes com as quais você já trabalhou e tem uma grande identificação, não?

Lázaro é meu grande amigo. Um irmão. Ele e Taís. Participar do primeiro filme dele é uma honra para mim. Ele não é somente um dos maiores atores do nosso País, mas é também um grande pensador. Estar com ele é me unir aos pensamentos que acredito. E Renata Sorrah é uma diva, referência para mim. Amiga, grande atriz e grande mulher.

Você também está no elenco de Marighella. Um filme que foi aplaudido de pé em Berlim, mas aqui, segundo o diretor Wagner Moura, sofreu censura por parte do atual governo federal. Como vê essa questão?

A estreia de Marighella foi adiada algumas vezes. Passou por vários festivais internacionais e foi muito bem recebido e avaliado. Chegou a hora de o Brasil assistir a essa história. Tenho certeza de que é mais um belíssimo trabalho de Wagner. Meu parceiro e grande amigo.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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