Rio exibe a arte da pintora Eleonore Koch, que vai ganhar um novo livro

02/05/2022 07:42
Por Antonio Gonçalves Filho / Estadão

O Rio de Janeiro teve uma importância enorme na mudança de orientação da pintura de Eleonore Koch (1926-2018), artista alemã mais conhecida como Lore, que viveu oito anos na cidade antes de se radicar definitivamente em São Paulo. Também por isso, o Museu de Arte do Rio (MAR) abriga até 8 de maio a exposição Eleonore Koch: Espaço Aberto, a maior já montada após sua morte. Hoje um nome internacionalmente consagrado, Lore Koch, que morou em Londres e lá realizou algumas exposições, ganhou uma mostra abrangente que cobre todos os períodos de sua produção, destacando-se as obras produzidas no Rio entre 1960 e 1968.

Organizada pela Casa Stefan Zweig de Petrópolis em colaboração com a Galeria Almeida & Dale, a retrospectiva deve chegar a São Paulo em outubro, ocupando sua sede e ganhando ainda um novo livro bancado pela galeria. A cidade foi adotada por seus pais quando fugiam da perseguição nazista. A exposição conta com 150 obras pertencentes a colecionadores particulares, entre eles uma grande amiga de Lore Koch, Margrit Herzberg, cuja família desembarcou no Brasil na mesma época. Pertence a ela uma das raras telas de Lore que representam figuras humanas, um retrato de Djanira, filha de Volpi (1896-1988), pintado em 1955 – Lore foi a única discípula do pintor.

O período vivido no Rio de Janeiro, lembra a curadora da mostra Fernanda Pitta, “coincide com a maturidade de sua pintura e a expansão de suas temáticas”. Na cidade, Lore, segundo a historiadora, “firma a gramática e o vocabulário de sua pintura, ganhando características próprias, independentes de seu mestre Volpi, no que diz respeito aos seus temas e às suas estratégias artísticas”.

De fato, o olhar intimista de Lore Koch para interiores e naturezas-mortas muda de foco com a natureza carioca. É no Rio que surgem suas primeiras paisagens, depois aperfeiçoadas durante o tempo em que viveu em Londres como intérprete da Scotland Yard. Grande parte de sua produção inglesa foi destruída num incêndio (em 1980) do castelo do barão e colecionador Alistair MCalpine, com quem manteve um contrato de exclusividade de 1971 a 1977 – daí a quase ausência de obras inglesas desse período na mostra do Rio. As poucas que restaram vieram com ela quando retornou ao Brasil, em 1989, ou foram comercializadas por galerias londrinas (Redmark, Rutland, Barbican).

Organizada por núcleos – Rio de Janeiro, paisagens, interiores e naturezas-mortas – a exposição tem pinturas em têmpera, técnica que aprendeu com Volpi, e desenhos em variadas técnicas (pastel, carvão e guache), alguns modelos de composição que Lore Koch transformava com simples variações de cor. Lore foi uma pessoa extremamente solitária. Sua natureza-morta, de matriz morandiana, não é só uma evasão para o mundo metafísico, mas uma maneira de transformar o mundo real, conferindo aos objetos um poder de imagem imantada que beira a manifestação hierofânica

Sua paisagem, embora baseada em fotografias (da própria artista) de lugares reais (o Jardim Botânico do Rio, o Regent’s Park de Londres) tem igualmente algo de cenografia metafísica que sintetiza o ambiente por meio de uma seleção rigorosa de elementos – seja um vaso num parque, um píer distante numa praia isolada ou um poste no deserto do Arizona . Há inúmeros exemplos na mostra que remetem ao essencialismo dos ingleses Patrick Caufield e David Hockney, idolatrado por Lore Koch.

As paisagens do Rio não são menos melancólicas que as paisagens londrinas feitas por ela nos anos 1960, quando saiu do Brasil no auge da repressão militar. Embora não fosse militante política – em 1964 continuou pintando naturezas-mortas (há uma tela desse ano na mostra), alheia ao engajamento da arte pop. Em 1968, procurou um lugar civilizado para viver, Londres. As praias do Rio são representadas por um ou dois elementos (uma palmeira, uma barra de ginástica) e tons baixos. Nada muito diferente dos seus parques ingleses noturnos. Em suma: rigor e disciplina marcam a arte de Lore. Mesmo nos trópicos.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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