Rússia: suspeitos por ataque que matou mais de 130 aparecem em tribunal com sinais de agressão

25/mar 11:04
Por Redação O Estado de S. Paulo / Estadão

Quatro homens acusados de realizar o ataque à casa de shows na Rússia, que matou mais de 130 pessoas, compareceram perante um tribunal de Moscou no domingo, 24, sob acusações de terrorismo, mostrando sinais de espancamentos severos. Um parecia estar quase inconsciente durante a audiência.

Declarações judiciais diziam que dois dos suspeitos aceitaram a sua culpa no ataque, embora a condição dos homens levantasse questões sobre se eles estavam falando livremente. Houve relatos conflitantes nos meios de comunicação russos que afirmavam que três ou todos os quatro homens admitiram a responsabilidade.

Os investigadores acusaram Dalerdzhon Mirzoyev, 32 anos, Saidakrami Rachabalizoda, 30, Shamsidin Fariduni, 25, e Mukhammadsobir Faizov, 19, por cometerem um ataque terrorista que resultou na morte de outras pessoas. O crime tem uma pena máxima de prisão perpétua.

O Tribunal do Distrito de Basmanny, em Moscou, ordenou que os homens, todos identificados nos meios de comunicação como cidadãos da antiga república soviética do Tajiquistão, fossem mantidos sob custódia até 22 de maio, enquanto se aguarda investigação e julgamento.

A mídia russa publicou que os homens foram torturados durante o interrogatório pelos serviços de segurança, e Mirzoyev, Rachabalizoda e Fariduni mostraram sinais de hematomas graves, incluindo rostos inchados. Rachabalizoda também tinha uma orelha enfaixada. A mídia russa disse no sábado (23) que um dos suspeitos teve a orelha cortada durante o interrogatório. A Associated Press não conseguiu verificar o relato ou os vídeos que pretendiam mostrar isso.

O quarto suspeito, Faizov, foi levado de um hospital ao tribunal em uma cadeira de rodas e ficou sentado com os olhos fechados durante todo o processo. Ele foi atendido por médicos enquanto estava no tribunal, onde vestiu uma bata e calças de hospital, e foi visto com vários cortes.

Luto nacional

As audiências ocorreram enquanto a Rússia observava um dia nacional de luto pelo ataque de sexta-feira na casa de shows suburbana Crocus City Hall, que matou pelo menos 137 pessoas. O ataque, reivindicado por um grupo afiliado do Estado Islâmico, foi o mais mortal em solo russo em anos.

As autoridades russas prenderam os quatro supostos agressores no sábado, com mais sete pessoas detidas sob suspeita de envolvimento no ataque, disse o presidente russo, Vladimir Putin, em um discurso à nação na noite de sábado. Ele procurou vincular o ataque à Ucrânia e afirmou que os agressores foram capturados enquanto fugiam para lá. Kiev tem negado firmemente qualquer envolvimento.

Os eventos em instituições culturais foram cancelados no domingo, 24, as bandeiras foram baixadas a meio mastro e o entretenimento e a publicidade televisivos foram suspensos, segundo a agência de notícias estatal RIA Novosti. Um fluxo constante de pessoas se juntou a um memorial improvisado perto da casa de shows incendiada, criando um enorme monte de flores.

“As pessoas vieram a um concerto, algumas pessoas vieram relaxar com as suas famílias e qualquer um de nós poderia estar nessa situação. E quero expressar minhas condolências a todas as famílias que foram afetadas aqui e quero prestar homenagem a essas pessoas”, disse à AP Andrey Kondakov, um dos enlutados que foi depositar flores no memorial.

“É uma tragédia que afetou todo o nosso país”, disse Marina Korshunova, que trabalha com jardim de infância. “Simplesmente não faz sentido que crianças pequenas tenham sido afetadas por este evento.” Três crianças estavam entre os mortos.

‘Ninguém viu nada, ninguém pôde dizer nada’

As equipes de resgate continuaram a revistar o prédio danificado e o número de mortos aumentou à medida que mais corpos foram encontrados, com parentes e amigos de alguns dos ainda desaparecidos aguardando notícias. O Departamento de Saúde de Moscou disse no domingo que começou a identificar os corpos dos mortos por meio de testes de DNA, dizendo que o processo levaria pelo menos duas semanas.

Igor Pogadaev procurava desesperadamente quaisquer detalhes sobre sua esposa, Yana, que foi ao show do ataque. A última vez que ele teve notícias dela foi quando ela lhe enviou duas fotos da casa de shows Crocus City Hall.

Depois que Pogadaev viu notícias de homens armados abrindo fogo contra os espectadores, ele correu para o local, mas não conseguiu encontrá-la nas inúmeras ambulâncias ou entre as centenas de pessoas que haviam conseguido sair da casa de shows.

“Eu dei uma volta, procurei, perguntei a todos, mostrei fotografias. Ninguém viu nada, ninguém pôde dizer nada”, disse Pogadaev à AP em uma mensagem de vídeo. Ele observou as chamas saindo do prédio enquanto fazia ligações frenéticas para uma linha direta para parentes das vítimas, mas não recebeu nenhuma informação.

À medida que o número de mortos aumentava no sábado, Pogodaev vasculhou hospitais na capital russa e na região de Moscou, em busca de informações sobre pacientes recém-admitidos. Sua esposa não estava entre os 182 feridos relatados, nem na lista de 60 vítimas já identificadas pelas autoridades, disse ele.

‘Ato terrorista bárbaro e sangrento’

A filial do Ministério de Emergência da região de Moscou postou um vídeo no domingo mostrando equipamentos desmontando a casa de shows danificada para dar acesso às equipes de resgate.

Putin chamou o ataque de “um ato terrorista bárbaro e sangrento” e disse que as autoridades russas capturaram os quatro suspeitos enquanto tentavam escapar para a Ucrânia através de uma “janela” preparada para eles no lado ucraniano da fronteira.

A mídia russa divulgou vídeos que aparentemente mostravam a detenção e o interrogatório dos suspeitos, incluindo um que disse às câmeras que foi abordado por um assistente não identificado de um pregador islâmico por meio de um aplicativo de mensagens e pago para participar da operação.

Putin não mencionou o Estado Islâmico no seu discurso à nação, e Kiev acusou e presidente e outros políticos russos de ligar falsamente a Ucrânia ao ataque para atiçar o fervor da luta da Rússia na Ucrânia, que recentemente entrou no seu terceiro ano.

Estado Islâmico

Autoridades de inteligência dos EUA disseram ter confirmado a reivindicação do grupo afiliado do Estado Islâmico. “O EI é o único responsável por este ataque. Não houve qualquer envolvimento ucraniano”, disse a porta-voz do Conselho de Segurança Nacional, Adrienne Watson, em um comunicado. Os EUA compartilharam informações com a Rússia no início de março sobre um ataque terrorista planejado em Moscou e emitiram um alerta público aos americanos na Rússia, disse Watson.

O ataque foi um grande constrangimento para Putin e aconteceu poucos dias depois de ele consolidar o seu controle sobre o país por mais seis anos, em uma votação que se seguiu à mais dura repressão à dissidência desde os tempos soviéticos.

Alguns comentaristas nas redes sociais russas questionaram como as autoridades, que suprimiram implacavelmente quaisquer atividades da oposição e processaram os críticos, não conseguiram impedir o ataque, apesar das advertências dos EUA.

O EI, que lutou contra a Rússia durante a sua intervenção na guerra civil síria, há muito tem como alvo o país. Em um comunicado publicado pela agência de notícias Aamaq do grupo, o afiliado do Afeganistão do EI disse que tinha atacado uma grande reunião de “cristãos” em Krasnogorsk.

O grupo divulgou um novo comunicado no sábado na Aamaq, dizendo que o ataque foi realizado por quatro homens que usaram rifles automáticos, uma pistola, facas e bombas incendiárias. O texto afirmou que os agressores dispararam contra a multidão e usaram facas para matar alguns espectadores, classificando o ataque como parte da guerra em curso do Estado Islâmico com países que o grupo diz estarem lutando contra o Islã.

Em outubro de 2015, uma bomba plantada pelo EI derrubou um avião de passageiros russo sobre o Sinai, matando todas as 224 pessoas a bordo, a maioria delas turistas russos que regressavam do Egito.

O grupo, que opera principalmente na Síria e no Iraque, mas também no Afeganistão e na África, também assumiu a responsabilidade por vários ataques no volátil Cáucaso e em outras regiões da Rússia nos últimos anos. Eles recrutaram combatentes da Rússia e de outras partes da antiga União Soviética. Associated Press.

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