Salman Rushdie dispensou segurança e circulou livremente quando esteve na Flip

12/08/2022 16:29
Por Ubiratan Brasil / Estadão

O escritor indiano naturalizado inglês Salman Rushdie sempre buscou territórios sem histórico de atentados para desfrutar de algo que viu privado de sua vida desde 1989: segurança. E o Brasil foi um desses lugares, onde ele esteve em pelo menos três oportunidades: em 2003, na Bienal do Livro do Rio, e na Flip, da qual participou duas vezes, em 2005 e 2010.

A partir de 1989, Rushdie passou a trocar constantemente de endereços na Inglaterra e sempre estava acompanhado de seguranças depois da decisão tomada por um aiatolá do Irã, Khomeini, que, naquele ano, decretou uma fatwa, medida religiosa que condenava o autor à morte. O motivo era o conteúdo considerado profano para o islamismo de Versos Satânicos , livro no qual o profeta Maomé era visto de forma nada lisonjeira.

No Brasil, ele dispensava guarda-costas e até aceitava convites que, na Europa, seriam impossíveis, como posar para o fotógrafo do Estadão na área externa do Copacabana Palace, no Rio, em 2005. Ele chegou a ir ao Maracanã assistir a uma partida de futebol, acompanhado do cineasta João Moreira Salles, conhecido botafoguense. “Preciso voltar mais vezes a esse país”, dizia.

Em Paraty, Rushdie gostava de circular pelo calçamento irregular da histórica cidade fluminense, acompanhado do filho, o então pequeno Milan, que se tornou fanático devorador de doces caseiros vendidos nas ruas – em 2010, ele trouxe o outro filho, Luka.

O escritor também comparecia diariamente à sala de imprensa da Flip,bem cedo, quando utilizava um dos computadores disponíveis para checar e-mails e acessar páginas da imprensa inglesa.

Ao Estadão, em 2005, disse temer o recrudescimento da intolerância. “O universo de diferentes pontos de vista já não é tão largo, o que é uma regressão. E isso não está relacionado apenas a medidas governamentais, mas principalmente a quem detém os órgãos de informação”, disse.

Em apenas uma vez Rushdie se recolheu: foi no dia 7 de julho de 2005, quando atentados ao metrô de Londres deixaram 56 mortos. Naquela manhã, em Paraty, o Estadão presenciou o escritor enviar diversas mensagens, além de ler as notícias publicadas por jornais ingleses. Ele permaneceu em silêncio durante todo o tempo, com uma das mãos tapando a boca. Apenas suspirava lentamente em alguns momentos.

Curiosamente, ele lançou naquele ano o livro Shalimar, o Equilibrista, em que um artista sensível se transforma em um terrorista.

“Fiquei completamente chocado ao saber do ocorrido, especialmente por conta da violência como tudo aconteceu. A Inglaterra tem um antigo problema com as ações terroristas do IRA, mas o que aconteceu hoje não tem comparação”, disse ao Estadão, naquele dia.

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