06/04/2023 18:51
Por Afonso Vaz

No silêncio da noite ou mesmo em dias mais sombrios pelos quais atravessamos, vimos percebendo que o nosso pensamento tem se voltado para pessoas muito especiais, mas que já deixaram estas paragens.

Amigos, parentes próximos, enfim seres com quem pudemos conviver e que somente nos proporcionaram momentos de intensa felicidade e alegria.

Partiram – é verdade – mas suas palavras, ensinamentos, exemplos e o carinho sempre a nós dispensados, permanecem em nossa mente sem que possamos esquecê-los.

Admitimos que muitos hão de pensar que “paramos no tempo” vivendo e sonhando do passado, esquecendo o presente. Não! Não é verdade tal assertiva!

Observamos, por outra vertente, que o mundo em que vivemos é extremamente diverso de épocas passadas – é bem verdade que longínquas – onde prevaleciam normas e regramentos atualmente renegados a planos secundários.

De modo especial, os mais vividos – para não os intitularem idosos – hão que compreender as questões que pretendemos retratá-las, uma vez que bem clarificadas nos dias presentes.

Daqui de nossa janela, já ao anoitecer, estamos a vislumbrar árvores, flores e pássaros que “o tempo” ainda está a lhes permitir que existam, ante o mal trato dispensado à natureza, vislumbrando, em nossa mente, por outro lado, as figuras de meu pai e minha mãe. 

O primeiro sempre a “cantar” a poesia, os seus bem rimados versos.

De plano recordamo-nos do poema “Desventura” quando escreveu:

“Inda menino, quando a vida é pura, 

quando esta tem o seu melhor encanto, 

eu já sofria o meu primeiro pranto, 

com a morte prematura de meu pai”.

E, assim, tangido pela desventura, 

cheguei à adolescência, sem, no entanto, 

ter suavizada a sorte má, que tanto

me perseguia, impiedosa e dura.

E de tal forma com a adversidade me confundi, 

que se felicidade passou em meu caminho, eu não vi;

Nem sequer a senti, tanto que agora, 

já no ocaso da vida, me devora 

a saudade do tempo em que sofri!”.

Do livro que fizemos publicar, prefaciado pelo inesquecível professor e acadêmico Roberto Fransciso, ao relembrar o poeta, assim se expressa ao término de suas palavras:

“Quanto a nós, velhos amigos:

Vemos, no momento certo,

se, em nós, a lembrança teima;

saudade é qual sol de inverno,

pois nos aquece e não queima”

Todavia, no sentido de busquemos afastar nossos pensamentos e recordações noturnas, conforme deixamos assinalado no início deste texto, aproveitamos também para relembrar o pai/poeta e esposo amado, quando ao escrever trovas, assim o fez:

Para minha mãe:

Apaixonado…

“Tive tudo, nesta vida,

tudo, tudo quanto quis.

Sem você, porém, querida

jamais seria feliz”.

Para o pai, poeta Afonso Athayde de Guedes Vaz, denotando saudade…

“Quando meu pai, tu partiste,

ainda moço, desta vida,

foi que senti como é triste

e dói tanto a despedida”

Como cristão e paternal: 

“É Natal…E, numa prece

a Jesus onipotente,

eu peço uma farta messe

de graças… pra toda gente”

E, ainda:

Se pra ferir-nos alguém,

o nosso filho ofendeu,

não se lembrou, se esqueceu

de quem tem filho também.”

Esta figura que nunca poderemos esquecer, juntamente com sua amada esposa, minha querida mãe, deixou-nos em 17 de junho de 1989, a mim parecendo me foi ontem…!

Entretanto, Osmar de Guedes Vaz já deixara escrito, em dezembro de 1977, inúmeras quadrinhas propugnando pelas boas amizades, pelo fazer o bem, além de muitas outras mensagens que sempre denotavam seu espírito envolvido com a bondade, o carinho e, em especial, com as amizades duradouras.

Em dezembro de 1977, publicou “No Epílogo da Vida”:

“Jamais tive receio de morrer,

nada a respeito desse triste evento,

já que entendo não ter por que temê-lo,

me preocupa, intimida ou martiriza:

Não me importa, também, meu pensamento,

para muitos, terrível pesadelo,

e que, um dia, na certa, há de ocorrer,

nem de longe, afinal, do extremo instante,

o irreversível acontecimento,

que já não me parece tão distante.

Tenho, porém, horror ao sofrimento,

que, embora, sem razão para merecê-lo,

pode estar, entre nós, sempre presente,

Nessa fase sombria, e algo imprecisa,

que precede, de forma rotineira,

O epílogo da vida, quando a gente

na penumbra de um quarto, e que divisa,

sob uma baça luz, bruxoleante,

quase a se extinguir: o espectro da morte,

num estranho e funéreo parâmetro,

que lhe envolve a figura sorrateira.

Por isso, eu peço a Deus a boa sorte,

de permitir a mim, em tal momento,

um doce e calmo fim, sem alarido.

Sem que haja desespero, um só gemido,

meu coração batendo ainda no peito, 

alegre, venturoso, satisfeito, 

pela certeza do dever cumprido.

Porquanto, o meu desejo mais ardente

é, um dia, morrer suavemente, tranquilo, sem remorsos, de mansinho,

assim, como se fosse um passarinho.”

Na verdade, o Pai Maior fez escutá-lo tendo partido o pai, o poeta, o esposo, o avô, assim “como se fosse um passarinho”, em 17 de junho de 1989.

A Deus pedimos que possa nos conceder a mesma graça, desde que merecedores da infinita bondade advinda das Alturas.

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