Sinal de corte de juros do Fed mantém Ibovespa em nível recorde

21/ago 17:53
Por Luís Eduardo Leal / Estadão

O Ibovespa emendou nesta quarta-feira, 21, a terceira alta, e a terceira máxima histórica em sequência, no fechamento, tendo alcançado também novo recorde durante a sessão, na casa dos 137 mil pontos – em renovação de pico histórico intradiário desde a última quinta-feira.

Nesta quarta-feira de atenção concentrada na ata da mais recente reunião de política monetária do Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), o índice da B3 oscilou dos 136.085,84 aos 137.039,54, saindo de abertura aos 136.088,18 pontos. No fechamento, mostrava alta de 0,28%, aos 136.463,65 pontos, com giro a R$ 21,3 bilhões na sessão. Na semana, o Ibovespa avança 1,87%, elevando o ganho do mês a 6,90% e o do ano a 1,70%.

A sessão desta quarta-feira refletiu, pela manhã, relativa cautela com os dados revisados sobre o mercado de trabalho dos Estados Unidos até março de 2024 – que mostraram crescimento ainda “saudável” para o emprego no país, na avaliação da consultoria Capital Economics.

No meio da tarde, a atenção global voltou-se à ata do Fed sobre a reunião do fim de julho, o evento mais aguardado do dia – e destaque também na agenda da semana, com ponto alto para o discurso do presidente do Fed, Jerome Powell, na sexta-feira, em Jackson Hole, mantida até aqui a expectativa de que o BC dos EUA venha a iniciar cortes de juros em setembro.

No documento desta tarde, os dirigentes do Fed afirmaram esperar corte de juros nos Estados Unidos se os dados econômicos evoluírem conforme o esperado – e a vasta maioria deles considera que será apropriado reduzir a taxa de referência do BC americano na próxima reunião, em setembro, conforme era aguardado pelo mercado. Assim, após a ata do Fed à tarde, cresceu a chance de o BC dos Estados Unidos cortar os juros de referência em até 125 pontos-base este ano – com a perspectiva de redução de 100 pontos-base seguindo como provável.

Para a Capital Economics, a ata do Fed, de fato, confirma o corte de juros em setembro: a consultoria ainda espera uma redução de 25 pontos-base, mas reconhece que eventual deterioração do emprego no relatório oficial de agosto – e sinais mais claros de fraqueza econômica – ampliaria a chance de um relaxamento monetário mais agressivo, de 50 pontos-base.

Na B3, nesse contexto, “tem havido entrada forte de fluxo de capital estrangeiro”, favorecida por preços dos ativos domésticos “extremamente atrasados”, diz Rodrigo Marcatti, CEO da Veedha Investimentos. “Tem havido uma puxada mais rápida” nessa recuperação das ações, ainda que o “investidor local permaneça muito travado em renda fixa”, acrescenta Marcatti, destacando a visão do mercado de que os juros básicos domésticos, referenciados na taxa Selic, tendem a permanecer onde estão ou venham a aumentar.

No mês de agosto, até o momento, houve entrada de R$ 7,698 bilhões em fluxo estrangeiro, resultado de compras acumuladas de R$ 211,138 bilhões e vendas de R$ 203,441 bilhões. No ano, o capital externo ainda está negativo em R$ 28,872 bilhões. No dia 19, quando o Ibovespa fechou então em máxima histórica a 135.777,98 pontos com alta de 1,36%, e o giro financeiro foi a R$ 25,5 bilhões, os investidores estrangeiros ingressaram com R$ 1,281 bilhão na B3.

Por outro lado, “os multimercados, que têm uma parcela de alocação em Bolsa, há meses vêm registrando resgates – sem muita bala, portanto, para entrar na Bolsa agora, nesse patamar”, acrescenta Marcatti. “Mas para o estrangeiro, dada à desvalorização do real e os preços defasados na Bolsa, há uma arbitragem super positiva, de forma que devemos ainda observar fluxo de ingresso de capital externo, se nada mudar”, diz.

“Há uma pequena lua de mel, com notícias positivas”, aponta o CEO da Veedha, enfatizando não apenas o cenário global mais favorável – com diminuição da expectativa por recessão a partir dos Estados Unidos – como também a melhora na economia doméstica, na margem.

“A melhora na perspectiva de crescimento do PIB para o ano – com casas consideradas muito boas em estimativas já prevendo alta de 3% – resulta também em elevação de recomendação para os papéis de empresas brasileiras, que já vêm de uma temporada boa de resultados no segundo trimestre em setores como os de bancos, varejo e cuidados de saúde, entre outros. Instituições ‘gringas’ têm elevado a recomendação para a compra de ações brasileiras, o que contribui para entender essa recuperação vista no fluxo estrangeiro para a Bolsa daqui”, observa Cesar Mikail, gestor de renda variável na Western Asset.

Ele menciona uma conjunção de fatores externos e domésticos que ajudam a entender a coexistência de expectativa por alta da Selic até o fim do ano e de Ibovespa em máxima histórica. “A fala de Powell na sexta-feira será importante para o mercado entender qual será o grau de ajuste nos juros americanos – e a ata de hoje confirmou a expectativa de corte em setembro. O Brasil, com outros emergentes, se beneficia desse sinal de juros mais baixos nos Estados Unidos. E, no plano doméstico, contribuiu muito a recente fala ‘hawkish’ do Gabriel Galipolo”, diz Mikail, em referência ao diretor de política monetária do BC, considerado o favorito a substituir Roberto Campos Neto na presidência da autarquia – uma transição que parece, no momento, mais suave do que o mercado chegou a temer.

“Tudo isso ajuda a entender não apenas a recuperação da Bolsa, como também o câmbio no nível atual: um pouco abaixo de R$ 5,50, após ter chegado a R$ 5,70 ou R$ 5,75, recentemente. Há também sinal de maior responsabilidade fiscal nas próprias falas do presidente Lula, o que apoia essa melhora geral de sentimento. A expectativa de crescimento do PIB tem sido revisada para cima, silenciando assim as críticas políticas sobre o nível da Selic”, diz o gestor.

Na B3, a alta desta quarta-feira foi impulsionada pelo setor metálico em dia de recuperação de preços para o minério de ferro na Ásia, o que resultou em avanço de 1,92% para Vale ON e de até 3,83% (Gerdau PN) para as siderúrgicas. Em Dalian, na China, o contrato mais negociado do minério, para janeiro de 2025, subiu 4,58%, para nível correspondente a US$ 104 por tonelada. E, em Cingapura, a alta foi de 3%, com o principal contrato ainda abaixo de US$ 100, a US$ 98,30 por tonelada.

O dinamismo proporcionado pelo segmento compensou o efeito mais uma vez negativo de Petrobras (ON -0,88%, PN -0,60%, em dia de baixa acima de 1% para o Brent e o WTI) – e, hoje, de moderada retração entre os grandes bancos (Itaú PN -0,40%, Bradesco PN -0,45%). Na ponta ganhadora do Ibovespa, destaque para CVC (+12,75%), Petz (+7,07%) e Gerdau. No lado oposto, Assai (-3,42%), Dexco (-2,29%) e Cogna (-2,11%).

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