‘Sweeney Todd’ ganha versão caprichada com cenário imersivo

15/03/2022 08:30
Por Ubiratan Brasil / Estadão

Depois de meses ensaiando suas partituras, os atores Rodrigo Lombardi e Andrezza Massei chegaram à mesma conclusão: trata-se do mais desafiador trabalho que vão enfrentar no palco. A dupla é protagonista do musical Sweeney Todd – O Cruel Barbeiro da Rua Fleet, que estreia nesta sexta, 18, no 033 Rooftop do Teatro Santander. “Trata-se de um espetáculo ao mesmo tempo muito sofisticado, mas também com grande poder de comunicação”, observa Lombardi.

De fato, com música e letras de um dos maiores compositores americanos do gênero, Stephen Sondheim (1930-2021), Sweeney Todd é um trabalho engenhoso, com canções que servem às letras. “Uma grande virtude é que as músicas narram a história e o elenco canta como se estivesse falando, o que confirma a fidelidade de Sondheim à tradição da Broadway”, comenta o diretor Zé Henrique de Paula.

Ele comanda um elenco de 17 atores para contar a narrativa sombria de Benjamin Barker (Lombardi), barbeiro que foi obrigado a deixar Londres ao ser condenado pelo inescrupuloso juiz Turpin (Guilherme Sant’Anna) por um crime que não cometeu. A época é a era vitoriana do século 19 e o ambiente é o lado sórdido da capital inglesa, onde a decadência e o desespero são evidentes, seja pela pobreza dos transeuntes, maltrapilhos e fedorentos, ou pela paisagem fumacenta e metálica.

“Mesmo as melodias mais românticas aparecem sob uma atmosfera nebulosa”, continua Lombardi, cujo personagem volta depois de 15 anos, disposto a se vingar – afinal, com seu exílio, a mulher morreu enlouquecida e a jovem filha, Johanna (Caru Truzzi), vive sob a tutela do juiz, que não esconde seus interesses sexuais. Agora, sob o pseudônimo de Sweeney Todd, ele encontra sua antiga barbearia, na Rua Fleet, transformada em uma miserável loja de tortas, administrada pela Dona Lovett (Andrezza). Amoral, ela o ajuda em um plano de vingança que também fará a loja prosperar, à custa de assassinatos e canibalismo daqueles que cruzam seu caminho.

“Sondheim é o mais heterodoxo dos compositores contemporâneos de musical, pois repetia sempre que se via como dramaturgo e não apenas como letrista”, observa Zé Henrique. “Por isso que, em suas partituras, as notas se modificam tanto que ele chega a aproximar as canções das falas.”

MÚSICA CONTÍNUA

Foi o que surpreendeu a crítica especializada quando o espetáculo estreou na Broadway em 1979: a dificuldade de cantar a partitura e a excentricidade da temática tornaram o espetáculo também atraente para artistas e plateias acostumados à ópera, público habitualmente avesso a musicais. Sweeney Todd é praticamente música contínua, forma encontrada por Sondheim para homenagear os melodramas britânicos do século 19, nos quais a música era executada continuamente pela orquestra enquanto os atores diziam suas falas – ele se inspirou no livro O Colar de Pérolas, de 1846, escrito por Thomas Peckett Prest e James Malcom Rymer.

“É o que o torna um espetáculo engenhoso”, atesta Fernanda Maia, responsável pela adaptação e a direção musical. “Em seu compromisso de contar uma história, Sondheim elaborou uma condição emocional para as canções que envolve teatralmente cada personagem. Não podemos nos esquecer que ali estão pessoas massacradas pelo sistema, cuja lei é ditada e transformada pelo juiz ao seu único interesse.”

“Todas as pessoas dessa história vivem com escassez de sentimento”, comenta Mateus Ribeiro, que vive Tobias Ragg, garoto que se torna auxiliar de Lovett, depois da derrocada de seu patrão, o negociante Adolfo Pirelli (interpretado alternadamente por Elton Towersey e Pedro Navarro), cujo famoso elixir é desmascarado. “Daí as atitudes moralmente condenáveis.”

As palavras, portanto, são todas necessárias na condução da história, daí a decisão de Fernanda de não acrescentar nenhuma sílaba em sua tradução. “Sondheim trabalha com acentos e monossílabos, a ponto de a primeira canção ter mais de 35 rimas.” O cuidado em não alterar o original é assumido também pelo elenco, que canta com alternância de tempo e reações.

“É um trabalho belíssimo, mas que exige muito cuidado no canto, pois há várias aliterações”, informa Andrezza Massei. “Sondheim era um poeta que brincava com o termo certo”, completa Lombardi. “Na canção Meu Amor há muitas palavras com a letra S, o que torna o cantar mais sussurrante e, portanto, romântico.”

E, para acompanhar com intimidade essa visão gótica da amoralidade humana, o espectador poderá escolher se prefere sentar mais perto da barbearia, na Rua Fleet, ou próximo da mansão do juiz corrupto, pois o espaço do 033 Rooftop não é convencional. “O cenário lembra uma cidade cenográfica, com a ação acontecendo em diversos pontos e fazendo com que o público se mexa em sua cadeira para acompanhar tudo”, explica Zé Henrique. “Haverá até lugares no banco da praça.”

Diretor e elenco concordam que a versão cinematográfica dirigida por Tim Burton em 2007, com Johnny Depp e Helena Bonham Carter, vai alimentar o interesse pela montagem nacional. “O filme popularizou a história e se tornou um aliado”, diz Lombardi. “A fome, que também é bem representada no longa, tornou-se um assunto ainda mais atual, infelizmente”, comenta Andrezza. “Por fim, o espectador terá o prazer de descobrir a grandeza da música de Sondheim quando é apresentada ao vivo”, lembra Zé Henrique, referindo-se à banda de nove músicos que estará em cena.

Sweeney Todd

033 Rooftop – Teatro Santander. Av. Juscelino Kubitschek, 2.041. 6ª, 21h30. Sáb., 16h e 20h30. Dom., 18h. R$ 75 / R$ 220. Estreia 18/3

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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