Toda a poesia de Chagall em 191 peças raras no CCBB

07/02/2023 07:01
Por Antonio Gonçalves Filho / Estadão

O crítico norte-americano Robert Hughes dizia que o pintor de origem russa Marc Chagall (1887-1985) era a “quintessência do artista judeu do século 20”. Se ainda paira alguma dúvida a respeito, a mostra Marc Chagall: Sonho de Amor, que abre nesta quarta, 8, no Centro Cultural Banco do Brasil, é a demonstração inequívoca de como Chagall atravessou o século 20 fiel às origens e impermeável a qualquer influência dos vanguardistas – fossem eles os construtivistas russos do começo do século ou os cubistas franceses dos anos 1920.

Chagall foi sempre ele mesmo. Carregou por toda a vida a carga religiosa de sua formação hassídica e a leveza poética da paisagem de sua infância na antiga aldeia russa de Vitebsk, hoje na Bielorrússia.

A exposição, que já passou por Brasília, Rio e Belo Horizonte, recebeu até agora 560 mil visitantes e deve atrair mais 100 mil até seu encerramento em maio, em São Paulo, segundo o diretor do CCBB, Cláudio Mattos. Trata-se de uma mostra deslumbrante, cuja leveza é anunciada logo na entrada, no átrio do Centro, onde o artista Daniel Wurtzel projetou uma instalação em que dois lenços coloridos flutuam de forma contínua, evocando as figuras voadoras de Chagall, sua marca registrada – depois apropriada por pintores como o pernambucano Cícero Dias (1907-2003).

Essa síntese das cores fortes do fauvismo com as metáforas do simbolismo – como na tela maior desta página, Os Noivos com Trenó e Galo Vermelho (1957), da coleção Ema Klabin – resultou numa combinação inspirada de séries que definiram a carreira de Chagall. A curadora brasileira da mostra, Cynthia Taboada, foi atrás de obras emblemáticas como essa, entre elas Primavera (1938-39), pertencente ao MAC, e o conjunto de águas-fortes feitas para o livro Maternité (1926), do escritor surrealista Marcel Arland, que faz parte da coleção de Mário de Andrade, primeiro colecionador de Chagall no Brasil.

MÓDULOS

Cynthia viu a exposição original na Itália, com curadoria de Lola Durán Úcar. Lutou para trazer a mostra ao Brasil, contando com o apoio do CCBB, que ajudou a ampliá-la, dividindo-a em quatro módulos: no primeiro encontram-se obras da juventude, entre elas uma preciosidade do Masp, Vendedor de Gado (1922), que retrata a vida rural em Vitebsk.

No segundo módulo, estão as obras que representam o mundo sagrado de Chagall – entre elas trabalhos das séries Bíblia e Exodus. No terceiro, destacam-se as peças produzidas pelo pintor logo após seu exílio americano – ele se refugiou nos Estados Unidos por causa da perseguição nazista. São telas, guaches e desenhos que retratam o mundo circense com trapezistas, bailarinas e acrobatas dos circos de sua infância em Vitebsk. Finalmente, no último módulo, a paixão e o amor que levam os amantes ao espaço, desafiando a gravidade, respondem por telas muito conhecidas como Os Amantes com Asno Azul (ca. 1955) ou Os Amantes com Buquê de Flores (1935-38).

“Nesse módulo temos obras de diversos períodos, dos anos 1930 ao período final (anos 1980), mas observamos a presença dos mesmos personagens que sempre povoaram o imaginário de Chagall, dos casais enamorados que flutuam aos violinistas e animais da sua infância em Vitebsk”, observa a curadora Cynthia Taboada.

Filho de um pobre trabalhador no comércio de pescado, que carregava barris de arenques para manter os nove filhos, Chagall aprendeu a desenhar copiando ilustrações de livros. As carroças que retratou em suas telas e desenhos traduzem o peso desse outsider hassídico que marcou a pintura moderna.

Marc Chagall: Sonho de Amor

CCBB. Rua Álvares Penteado, 112, Centro, tel. 4297-0600. Todos os dias, exceto às terças, 9h/20h. Gratuito. Van gratuita (R. da Consolação, 228). Até 22/5

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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