Um quebra-cabeças poético

20/01/2016 11:00

Sou um inquestionável defensor do soneto clássico com suas regras rígidas, mas aceito quem não o aprecie, o que não aceito é que o desmereçam, pois é o estilo que mais espelha a poesia através dos séculos. Por isto organizei, ao longo dos últimos anos, um modesto estudo a respeito, aglutinando inúmeros comentários de poetas do passado e atuais. E desse trabalho, retirei algumas observações :

Do poeta Mello Nóbrega, este trecho : “Em interessante estudo sobre o soneto, Otto Maria Carpeaux , na edição de O Jornal/RJ, de 10.10.48, procurou explicar a vitalidade dessa forma poética rígida e difícil, que vem resistindo, há séculos, às variações do gosto literário. E, recentemente, Aragon proclamou, em "Les Lettres Française", a necessidade de "honrar o soneto".

Do crítico literário Wilson Martins, num artigo de jornal:  "O exercício do poema de forma fixa teve significados diferentes para os modernistas e a Geração de 45. Se um soneto, sem defeitos, vale, por si só, um longo poema (Boileau dixit), deve-se compreender que a ideia central está na cláusula excludente, não na comparação pura e simples: poema de forma fixa, o soneto, sob pena de se desfigurar como soneto, só se pode equiparar em qualidade às outras composições e não apresentar nenhum defeito, segundo as suas próprias especificações técnicas. 

Mas Antonio Huaiss, no prefácio do livro “Reunião”/1968, de Drummond, concede à forma fixa, uma profunda conotação pejorativa, com um radicalismo exacerbado. E entre tantos "conceitos" firmados por ele, o texto classifica como "cegos" os que não apreciem a poesia moderna e a certa altura transcreve (apoiando) a visão de Luis Costa Lima que, por sua vez, faz eco a Otto Maria Carpeaux (teria mudando de visão?): Quem ainda considera a poesia como enfeite decorativo, não pode compreender o poeta cuja matéria é a vida presente. Quem aprecia nos versos a harmonia artificial dos ritmos e das rimas, não admitirá que na vida a dissonância é, conforme Nietzsche, a regra e o acorde a exceção; e que o poeta pode ter todos os privilégios menos o de mentir." 

Bem, não vai aqui qualquer possível crítica a Drummond, mas vai sim, à observação impertinente do comentário. Mesmo vindo de pessoas respeitadas como Houaiss e Luis Costa Lima, poema metrificado não é "enfeite decorativo" nem possui "harmonia artificial" como querem demonstrar na nota, nem são "cegos" seus admiradores e nem mentem, sendo normal a presença de muita sensibilidade, principalmente, nos sonetos – o que prova o totalitarismo de opinião, desqualificando-os para tal análise e julgamento. O valor de um poema – como de qualquer prosa, depende do tema abordado, da maneira e do desenvolvimento de seu texto. Independentemente do estilo. Assim, o preconceito é evidente, pois não aceitam que ainda haja um segmento tradicional para perturbar a caminhada dos egocêntricos e que provoca pavor traumático quando na verdade. Para quem se habitua a utilizar as regras o faz com total comodidade, fluidez, facilidade e naturalidade. É somente uma questão de hábito, mas parece que o soneto vem a ser o “lobo mau” da poesia – provoca certo pavor a quem dele se aproxime. E Houaiss, criticando a metrificação está, diretamente, se opondo ao soneto e à trova que, sem métrica e rima, deixam de sê-los. Eles não entenderam que o soneto é, na verdade, uma quebra-cabeça da poesia – um desafio… – jrobertogullino@gmail.com

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