‘Vá vestir uma fralda, cachorro’, diz preso a juiz; ‘Sou mais perigoso que Beira-Mar’

01/out 22:09
Por Pepita Ortega / Estadão

O juiz Felipe Barros, auxiliar da Corregedoria-Geral de Justiça do Rio Grande do Norte, conduziu uma inusitada audiência de custódia na semana passada. Ao homologar a prisão de um homem acusado de furto, detido por populares, o magistrado ouviu: “O senhor tá me dando uma preventiva? Acho que o senhor nem usou cueca hoje para ir pro tribunal. Preventiva sem eu estar devendo? Vá vestir uma fralda, cachorro.”, disse Alisson, o preso.

A audiência de custódia durou menos de dez minutos e terminou com o magistrado oficiando o Ministério Público para apuração de desacato a todos os presentes na audiência. Também foi determinado que o Gabinete de Segurança Institucional do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte “fique de olho” no acusado.

“Não me senti ameaçado, me parece mais ser um mal educado do que qualquer outra coisa. Mas por via das dúvidas vou encaminhar”, anotou o juiz pouco antes de encerrar a audiência.

O caso foi registrado na quinta-feira, 26, seguindo o rito de praxe de uma audiência de custódia – procedimento em que é avaliada a legalidade da prisão. Alisson respondeu a perguntas sobre sua detenção.

Ele disse ser cabeleireiro e narrou que tinha “ferimentos de uma tentativa de homicídio”. Alisson foi detido por populares após um crime de furto, e, em seguida, foi levado à delegacia. Alegou que foi ferido ao ser contido.

Quando o juiz perguntou onde Alisson mora, ele citou um endereço em Afonso Bezerra e bradou: “Lá onde eu toquei fogo numa viatura sem nem pegar nela, só com a minha ordem. Sou mais perigoso que Fernandinho Beira-Mar, só basta estalar dedo que o fórum, sua casa explode.”

Alisson se referia ao líder da facção criminosa Comando Vermelho, que estava custodiado no presídio de Mossoró até março deste ano. Após a cadeia registrar a primeira fuga do sistema federal, ele foi transferido.

“E quem vai lá sou eu pipocar, se o senhor me der uma cadeia. Confirma o senhor? Com quem o senhor tá falando aqui? Que eu sou dos Carneiros”, arrematou, em referência à facção criminosa que atua no Rio Grande do Norte.

Durante a audiência, o juiz Felipe Barros não mudou o tom. “Certo”, disse após as ameaças de Alisson. Enquanto o magistrado e o representante do Ministério Público se manifestavam na audiência, o preso deu risadas, fez caretas e bateu palmas.

“Ainda bem que o senhor sabe que é uma autoridade aqui também”, retrucou o preso. “Peguei três anos por desacato com as palavras. Acho que é três minutos de acréscimo que o senhor tem pra falar comigo”, completou.

Em seguida, o juiz perguntou se Alisson tinha alguma reclamação sobre os policiais que o prenderam. Ele respondeu que não, que os agentes foram gentis com ele. Quando eles chegaram ao local, Alisson já estava detido pela população. Ele sustentou que feriu o olho na confusão com os populares.

“Faz dois dias que durmo numa delegacia com os policiais me dando salsicha. Vou reclamar da polícia? A polícia me tratando com respeito mais do que a população da cidade. A policia tá de parabéns”, disse, batendo palmas.

A decisão de manter Alisson preso seguiu o parecer do Ministério Público do Rio Grande do Norte. O promotor destacou que o preso já respondeu por crimes de ameaça, roubo e extorsão. Frisou que Alisson é uma pessoa perigosa e pode ameaçar o magistrado. O representante do MP na audiência chegou a “homenagear” a paciência do juiz Felipe Barros.

A prisão preventiva foi justificada pelo histórico de vários delitos atribuídos a Alisson, apesar de o furto que o levou à cadeia não ter sido praticado com violência ou grave ameaça, anotou o magistrado.

Uma mulher que foi presa na mesma confusão acabou liberada mediante o cumprimento de medidas cautelares, em razão de não ter antecedentes. Alisson bateu palmas quando o juiz anunciou a soltura da moça.

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