Verbas federais minguam e Prefeitura precisa complementar recursos

Em verbas emergenciais enviadas pelo governo federal, PMP prestou conta de R$ 320 mil a mais do que o que teria recebido inicialmente; município deve pagar o valor excedente

14/06/2022 08:25
Por João Vitor Brum

Dias depois do Ministério Público do Estado Rio de Janeiro mover ação civil pública pedindo que a Prefeitura regularize a prestação de contas no Portal da Transparência, o município atualizou os gastos de verbas enviadas após as chuvas de fevereiro e março. No entanto, a prestação foi feita parcialmente, sem explicações detalhadas. Há, pelo menos, três recursos enviados pelo governo federal com a prestação de contas referente aos gastos acima do valor enviado, chegando a um total de R$ 326 mil a mais. Segundo o Comitê da Transparência da Prefeitura, o valor excedente foi custeado pela Prefeitura, informação que não consta no Portal da Transparência.

Município vai custear valores excedentes a partir de verbas federais

As novas prestações de contas de resposta ao desastre incluídas no portal nesta semana são todas referentes às verbas enviadas pelo governo federal, por meio do Ministério de Desenvolvimento Regional após solicitações da Prefeitura, totalizando R$ 10,5 milhões. Dos recursos carimbados, um teria sido devolvido, dois teriam sido gastos em sua totalidade, seis foram parcialmente usados e uma permanece intocada nos cofres da Prefeitura.

No total, o Ministério enviou R$ 10.531.883,30, com a destinação de R$ 8.915.596,49, ou 84% do total discriminado no Portal. Porém, o valor total com destinação indicada inclui pelo menos R$ 326.228,10 que superam suas respectivas verbas.

Deste total, uma das maiores verbas, de R$ 1.676.000, destinada à compra de cestas básicas, kit de higiene e dormitório, e colchões, foi devolvida ao Ministério por “não haver a necessidade da aquisição dos referidos materiais, visto que os mesmos foram doados ao Município”. 

Somados aos R$ 1,6 milhões, a Prefeitura também devolveu R$ 36.861,52 em rendimentos e R$ 1.344,68  – que não há informações do que se trata este valor, totalizando R$ 1.712.826,52 devolvidos ao governo federal. O único recurso devolvido até agora. 

O recurso com maior discrepância entre o total enviado pelo Ministério e o gasto feito pela Prefeitura é com relação a uma verba de R$ 1.038.475,04, destinada para a recuperação de vias públicas, pontes de veículos e pedestres, guarda-corpos e margens de rios. No Portal, a Prefeitura presta conta de um gasto R$ 195.451,87 a mais do que o recebido pelo Governo Federal. O total de R$ 1.233.926,91 representa 18% do total enviado.

Os documentos disponíveis apontam que a verba foi usada para a construção de muros de gabião na Rua Bingen, na Avenida Barão do Rio Branco e no Duarte da Silveira; e para o fornecimento de guarda-corpos, no Portal ainda não há informações detalhadas sobre o motivo que tornou as obras mais caras do que o valor enviado inicialmente.

Já um recurso de R$ 1.788.849,99 enviado para recomposição de vias públicas ficou R$ 129.431,55 mais caro na hora da prestação de contas. De acordo com a Prefeitura, foram gastos R$ 1.918.281,54, 7,2% a mais do que o previsto pelo município quando a verba foi solicitada.

Segundo a prestação de contas, os valores foram gastos para a recomposição de margem de rio na Rua Afrânio de Melo Franco; e para execução de muros de gabião nas ruas General Marciano Magalhães, Coronel Veiga, Bingen, Barão de Águas Claras, Belinha Cavalcanti, Frei Ciríaco e Ponte do Coveiro (no Moinho Preto) e na Avenida Barão do Rio Branco. 

Sobre a diferença nos valores, o Comitê da Transparência da Prefeitura esclarece que, quando a Prefeitura faz um programa de trabalho para receber recursos do governo federal, o próprio governo federal já estabelece um valor específico para aquela intervenção.

Quando o projeto básico é executado pelo município, é possível que haja alguma diferença (entre o valor repassado pela União e o valor de execução da intervenção). Em regra, essas diferenças são pequenas, como pode ser visto no Portal da Transparência. Nesses casos, as diferenças são custeadas pela Prefeitura. No caso especificamente das verbas referentes ao desastre, a “diferença pequena” ultrapassou os 300 mil reais.

O município esclarece, ainda, que esses recursos (a diferença entre o valor repassado pela União e o valor de execução da intervenção) foram suplementados nas dotações orçamentárias existentes em cada secretaria.

A origem desses valores é de recursos próprios do município, e a suplementação foi possível ou porque houve excesso de arrecadação em determinada fonte ou em função de cancelamento de algum recurso destinado a determinada área.

Verbas usadas parcialmente

Ainda dentro do total de R$ 10,5 milhões enviados pelo Ministério de Desenvolvimento Regional, estão verbas gastas parcialmente pelo município, totalizando pouco mais de R$ 4 milhões gastos até o momento e R$ 1,2 milhão que ainda não possuem uma destinação definida. 

A primeira, de R$ 644.206,95, é destinada para o aluguel de veículos e compra de combustível para ações da Defesa Civil. Foram gastos, até o momento, R$ 426.091,20, com R$ 218.115,75 ainda disponíveis para aplicação.

Uma outra verba de R$ 439,263,30 também é referente à locação de veículos, estes para veículos de apoio logístico à ações de reabilitação e assistência. Para este recurso, há a prestação de contas de R$ 149.610,60, mas sem a publicação do contrato firmado com a empresa. Ainda há R$ 289.652,70 disponíveis.

As três verbas restantes são destinadas para a recuperação de vias públicas, em um total de R$ 3.791.279,25. Deste valor, R$ 2.286.883 foram enviados em um único recurso, e foram gastos R$ 1.802.084,43, com R$ 484.798 ainda disponíveis.

Deste valor, R$ 859 mil foram destinados para a construção de muros de gabião na Avenida Roberto Silveira, R$ 843 mil para dois muros de gabião na Avenida Barão do Rio Branco e R$ 99 mil para recomposição de pavimentação e drenagem na Estrada do Paraíso.

A segunda verba para recomposição de vias, de R$ 1.185.237, teve R$ 895.521 gastos até o momento, com R$ 289 mil ainda disponíveis nos cofres do município. Deste valor, R$ 379 mil foram gastos em um muro de gabião na Avenida General Marciano Magalhães, R$ 145 mil foram destinados para um muro de gabião na Rua General Rondon, R$ 137 mil para um muro de gabião na Rua Alagoas, R$ 145 mil para um muro de gabião na Rua Juvenal Amaral, e R$ 86 mil para um muro de gabião na Rua do Encanto.

A última verba com essa destinação, de R$ 319.159,05, 99,32% (ou R$ 316.997) foram gastos, com R$ 2.161,68 ainda disponíveis. O valor gasto até o momento foi investido na recomposição de pavimentação e reparo em redes de águas pluviais na Vila Felipe e Chácara Flora, abrangendo as ruas Juvenal Amaral, Eduardo de Moraes, Jacinto Rabelo e na Travessa Goytacazes.

Há, ainda, uma verba de R$ 665.731,20 destinada para contratação de maquinário e pessoal para limpeza e desobstrução de ruas e rios, mas na página inicial do Portal da Transparência, não há prestação de contas. Porém, há uma lista com R$ 653.820 que teriam sido investidos, quase a totalidade do recurso.

Ação do MPRJ cobra transparência dos gastos públicos

A ação do MPRJ cobra do município informações referentes ao desastre de 2022, além de regularidade na implementação e alimentação das informações do portal no prazo de 30 dias. O assunto vem sendo discutido desde março, quando a 2ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva do Núcleo Petrópolis expediu recomendação para que o município dê a devida transparência aos gastos de recursos públicos em resposta às chuvas. 

Na ocasião, segundo o MP, foram localizados no Portal Aqui Tem Transparência apenas os saldos recebidos e as publicações de atos do Poder Executivo referentes às chuvas, sem informações quanto aos gastos públicos e demais dados exigidos pela legislação. 

Após a ação ser ajuizada na última segunda-feira, dia 6 de junho, o município começou a atualizar o portal e enviou, na noite de sexta-feira, dia 10, uma nota à Tribuna informando que o site está atualizado, indicando que as contas sem prestações seriam referentes a gestões anteriores. Porém, é importante ressaltar que a prestação de contas referente à tragédia de 2022 era uma das preocupações do MP na ação.

Prefeitura diz que atual gestão não foi alvo de ação do MP

Em nota sobre a ação do Ministério Público cobrando transparência, a Prefeitura informou que o Portal está atualizado com todas as informações referentes aos contratos firmados pelo município. O inquérito civil foi aberto em 2017, e a Prefeitura lamenta que as duas gestões anteriores não tenham executado as recomendações indicadas.

O município também destaca que documento do Grupo de Apoio Técnico Especializado (GATE/MPRJ), anexo ao processo, mostra que, dos assuntos que ainda não foram superados entre a data do relatório (16/5/2022) e o ajuizamento da ação (3/6/2022), apenas 3 das 80 exigências aplicáveis ao município no que se refere ao Portal da Transparência geral não foram cumpridas. O percentual de avaliação de acessibilidade é de 85,68%, o que, como diz o próprio MP, está dentro do preconizado pelo Modelo de Acessibilidade em Governo Eletrônico. 

Ainda de acordo com a Prefeitura, o documento do GATE/MPRJ também é claro ao reconhecer o esforço do município em garantir a transparência sobre a utilização dos recursos da resposta pós-chuvas: “No decorrer da análise do presente expediente e da documentação de suporte mencionada nesta Informação Técnica, restou comprovado que a Prefeitura de Petrópolis está promovendo a devida transparência aos recursos recebidos e gastos em virtude das chuvas ocorridas em 15/2/2022 e 20/3/2022 naquele município”.

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